Sejam bem vindos(as) !
Esperamos que neste ambiente, novas práticas de leitura e escrita surjam, impregnadas de criatividade e prazer. E que o mundo das letras possa ser analisado, compreendido e transformado ...

S@ndr@

quinta-feira, 9 de dezembro de 2010


Crônica do Natal (de novo) - Luís Fernando Veríssimo

Tenho inveja dos cronistas novos. Não porque eles não sabem que todas as crônicas de Natal já foram escritas e podem escrevê - las de novo. Mas porque podem fazer isto sem remorso.

Tem a crônica de Natal tipo "o que eu gostaria que Papai Noel me trouxesse". A Luana Piovani ou um fac-símile razoável, a paz entre os povos, um centroavante para o Internacional (ou um fac-símile razoável) etc...

Tem as infinitas variações sobre problemas encontrados por Papai Noel no mundo moderno (seu trenó levado num assalto, sua dificuldade em se identificar em portarias eletrônicas, protestos de ambientalistas contra o seu tratamento às renas, suspeita de exploração de trabalho escravo, suspeita de pedofilia etc).

Tem as muitas maneiras de atualizar a história da Natividade (Maria e José em fila do SUS, os Reis Magos chegando atrasados porque foram detidos por patrulhas israelenses ou militantes palestinos, Jesus vítima de uma bala perdida).

Tem as versões diferentes da cena na manjedoura, inclusive - juro que já li esta, se não a escrevi - narrada do ponto de vista do boi.

Todas já foram feitas.
Há tantas crônicas de Natal possíveis quanto há meios de se desejar felicidade ao próximo. Os cartões de fim de ano são outro desafio à criatividade humana. Pois todas as suas variações também já foram inventadas. Quando eu trabalhava em publicidade, todos os anos recebia encomendas de saudações de Natal e Ano Novo "diferentes", porque os clientes não se contentavam em apenas desejar que o Natal fosse feliz e o Ano Novo fosse próspero. Uma vez sugeri um cartão de Natal completamente branco com a frase "Aquelas coisas de sempre..." num canto, mas acho que este foi considerado diferente demais. E dê-lhe poesia, pensamentos inspiradores, má literatura e a busca desesperada do diferente. Um cartão em forma de sapato, de dentro do qual saía uma meia: a meia para o Papai Noel encher de presentes e o sapato para entrar no Ano Novo de pé direito.
Coisas assim.
Enfim, tudo isto é apenas para desejar a você... Aquelas coisas de sempre.

quarta-feira, 1 de dezembro de 2010


Feliz Natal! Merry Christmas! Feliz Navidad! Joyeux Noël ! 
Kala Christougena! Kala Christougena! Frohe Weihnacht...

Crônicas de Natal


À espera do Natal!
Nos tempos de criança ficávamos ansiosos e curiosos para saber o que iríamos ganhar, e, como seria a festinha que as pessoas fariam para agradar – nos na véspera do Natal.
Nossos pais não tinham dinheiro para comprar brinquedos, muito menos um lanche diferente. Então enfrentávamos filas enormes para ganhar um pacotinho de doce, um cachorro quente e um copo de refrigerante.
Depois novamente enfrentávamos mais uma fila imensa para ganharmos um carrinho de madeira. Que alegria! Saíamos sorridentes e felizes, imaginando como seria nosso próximo Natal.
Ao chegarmos em casa, todo cuidado era dedicado àquele presentinho tão especial e significativo.
Quanto tempo se passou... quantas lembranças daquele tempo... Hoje em época de Natal é tudo diferente; as crianças exigem o que querem ganhar. Nada mais é surpresa. O Natal perdeu a magia, o encanto...

Ademir de Oliveira

quarta-feira, 3 de novembro de 2010

Para que ninguém a quisesse

Porque os homens olhavam demais para a sua mulher, mandou que descesse a bainha dos vestidos e parasse de se pintar. Apesar disso, sua beleza chamava a atenção, e ele foi obrigado a exigir que eliminasse os decotes, jogasse fora os sapatos de saltos altos. Dos armários tirou as roupas de seda, da gaveta tirou todas as joias.
E vendo que, ainda assim, um ou outro olhar viril se acendia à passagem dela, pegou a tesoura e tosquiou-lhe os longos cabelos. Agora podia viver descansado. Ninguém a olhava duas vezes, homem nenhum se interessava por ela. Esquiva como um gato, não mais atravessava praças. E evitava sair. Tão esquiva se fez, que ele foi deixando de ocupar-se dela, permitindo que fluísse em silêncio pelos cômodos, mimetizada com os móveis e as sombras.
Uma fina saudade, porém, começou a alinhavar-se em seus dias. Não saudade da mulher. Mas do desejo inflamado que tivera por ela. Então lhe trouxe um batom. No outro dia um corte de seda. À noite tirou do bolso uma rosa de cetim para enfeitar-lhe o que restava dos cabelos.
Mas ela tinha desaprendido a gostar dessas coisas, nem pensava mais em lhe agradar. Largou o tecido em uma gaveta, esqueceu o batom. E continuou andando pela casa de vestido de chita, enquanto a rosa desbotava sobre a cômoda.
Marina Colassanti

Sapo ou Príncipe?

Você ainda sonha com um príncipe encantado?
Responda depois de ler esta crônica!!!

Era uma vez... numa terra muito distante...uma princesa linda, independente e cheia de autoestima. Ela se deparou com uma rã enquanto contemplava a natureza e pensava em como o maravilhoso lago do seu castelo era relaxante e ecológico...
Então, a rã pulou para o seu colo e disse: linda princesa, eu já fui um príncipe muito bonito. Uma bruxa má lançou-me um encanto e transformei-me nesta rã asquerosa. Um beijo teu, no entanto, há de me transformar de novo num belo príncipe e poderemos casar e constituir lar feliz no teu lindo castelo.
A tua mãe poderia vir morar conosco e tu poderias preparar o meu jantar, lavar as minhas roupas, criar os nossos filhos e seríamos felizes para sempre...
Naquela noite, enquanto saboreava pernas de rã sautée, acompanhadas de um cremoso molho acebolado e de um finíssimo vinho branco, a princesa sorria, pensando consigo mesma:
- Eu, hein?... nem morta!
Luís Fernando Veríssimo

0 MICO DO ANO

O que dizer daquelas festas de interior que só acontecem uma vez por ano nas comunidades?
Para quem vive isolado da cidade, trabalhando na roça, festar é uma boa oportunidade de sair da obscuridade e conhecer novos amigos.
Mas não é bem isso que acontece. Na maioria das vezes, essa é uma ocasião de ”pagar mico”.
Estamos eu e a minha melhor amiga encostadas num canto como se estivéssemos com medo de gente. De repente, um garoto se aproxima e pergunta:
- Você quer dançar?
Eu respondo ansiosa:
- É claro!
Ele, sem graça,diz:
- Eu estou convidando sua amiga!
Olho ao redor para ver se ninguém presenciou a cena. É claro que muitos viram, mas ninguém teve coragem de rir!
Que mico!
É... não foi dessa vez...
Vou voltar para casa sem namorado.

Josélia Borcate

terça-feira, 5 de outubro de 2010

Solidão também é crônica
Hoje amanheci falando com as paredes. Aliás, tenho feito isso há muitos dias, desde que perdi todas as pessoas que me rodeavam, por puro cinismo e ignorância da minha parte.
Levanto, escovo os dentes e tomo banho lembrando das doces palavras que eu ouvia da minha mulher. Ouço estalos na casa por ser muito grande e com muitos quartos. Não vou trabalhar, pois até isso eu perdi. E assim o dia vai passando devagar, mas passa. A minha esperança é no amanhã.
A noite chega e sinto meu coração apertar, doer de saudade dos bons tempos... Ligo a TV, começo a me animar. Pronto, acabou a luz! Esqueci de pagar a conta deste mês. Sento - me no sofá no escuro, pego o meu celular e começo ver as fotos de família. Num segundo imagens da vida passam em minha mente, mas agora é tarde...
Já sei, vou ligar para ela e pedir perdão. Mas se aqui nem celular pega... O jeito é me deitar, ver se consigo dormir um pouco.
Acordo no outro dia, tendo que recomeçar tudo de novo.

Josélia Borcate